Franziska Schmittner é gerente de projeto da Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH. Nesta entrevista, ela fala sobre o trabalho da GIZ no mundo, o programa Proklima, e sobre a parceria com o governo brasileiro. Em especial, aborda as ações no âmbito do Programa Brasileiro de Eliminação dos HCFCs – PBH, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, em parceria com a GIZ Brasil.
VOCÊ PODE EXPLICAR, RESUMIDAMENTE, COMO SE DÁ O TRABALHO DA GIZ, E SEUS BENEFÍCIOS PARA O MEIO AMBIENTE NO BRASIL E NO MUNDO?
A GIZ é uma organização com mais de 60 anos de experiência, que presta serviços para o governo alemão com o objetivo de promover o desenvolvimento sustentável, aliado à educação e à capacitação, no mundo. Hoje, a GIZ atua, efetivamente, em 120 países, por meio de projetos realizados em parceria com os governos locais.
Em resumo, é uma organização que se dedica a moldar um futuro que valha a pena ser vivido em todo o mundo, baseada em valores alemães e europeus.
Para alcançar esse objetivo, a GIZ trabalha na cooperação internacional com diferentes áreas, incluindo: desenvolvimento econômico e promoção do emprego; energia, meio ambiente e mudanças climáticas; desenvolvimento social e saúde global; governança e democracia; e construção da paz e segurança.
A GIZ tem sedes nas cidades de Bonn e Eschborn, na Alemanha, e mantém também escritórios nos países parceiros. Ao todo, conta com cerca de 25 mil funcionários e funcionárias, quase 70% do total, a propósito, são de pessoas do próprio país parceiro, sendo mais de 50% delas mulheres.
A GIZ implementa vários programas no mundo e no Brasil, entre os quais, o programa em que atuamos, o Proklima, em nome do governo alemão, por meio principalmente de três ministérios: Ministério Federal de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (BMZ); Ministério Federal do Meio Ambiente, Conservação da Natureza, Segurança Nuclear e Defesa do Consumidor (BMUV); e do Ministério Federal de Assuntos Econômicos e Ação Climática. No caso do Brasil, atuamos especialmente pelos ministérios alemães, BMZ e BMUV.
POR FAVOR, EXPLIQUE O TRABALHO DESENVOLVIDO NO PROGRAMA PROKLIMA?
O Proklima é um dos programas mais antigos da GIZ e baseia seu trabalho na proteção da Camada de Ozônio e do Clima, conforme definido no Protocolo de Montreal e na sua Emenda de Kigali, pelos quais a comunidade internacional se comprometeu a eliminar os gases que destroem a camada de ozônio (os hidroclorofluorcarbonetos – HCFCs) e reduzir o uso de substitutos prejudiciais ao clima (os hidrofluorocarbonetos – HFCs).
Ao mesmo tempo, o Proklima desempenha um papel no cumprimento dos requisitos do Acordo de Paris e na conquista dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), das Nações Unidas. Os projetos desenvolvidos no Proklima são focados, especialmente, nos setores de Refrigeração e Ar Condicionado (RAC), que estão inseridos em todas as atividades da economia, visando promover a transferência de conhecimento e tecnologias ecologicamente corretas para países parceiros, pela por meio da cooperação bilateral (neste caso, Brasil e Alemanha), para ajudá-los a desenvolver economias verdes de crescimento.
Os serviços do Proklima incluem assessoria política e desenvolvimento de capacidades para governos, bem como treinamento e qualificação profissional nas áreas Técnica e de Engenharia, impactando diretamente na vida das pessoas, com geração de emprego e melhoria da saúde. Além de realizar projetos-piloto com parceiros dos setores industrial, comercial e da sociedade civil.
Muitos treinamentos e troca de conhecimentos com foco nas iniciativas de “Resfriamento Verde” (Green Cooling) acontecem nos países parceiros, como o Brasil e, também, nos nossos centros de estudos e treinamentos na Alemanha.
Franziska Schmittner (na foto de blazer cinza) recebe delegação da Autoridade Geradora de Eletricidade da Tailândia na GIZ, durante viagem de estudo a Frankfurt e Berlim, na Alemanha.
NO CASO DO BRASIL, COMO SE DÁ A ATUAÇÃO DA GIZ, ESPECIALMENTE NO PROGRAMA PROKLIMA?
O Brasil é um parceiro de longa data da GIZ. Estamos atuando no país, na cooperação bilateral Brasil-Alemanha, desde 1962. São 60 anos de cooperação! No caso do Proklima, nossa parceria iniciou em 2003, com os primeiros acordos técnicos para formação profissional em cursos de boas práticas. Ou seja, no próximo ano, completamos 20 anos dedicados à capacitação de pessoas, com mais de 40 mil técnicas e técnicos de refrigeração treinados no país. Esse trabalho, em parceria com o governo brasileiro, ocorre no âmbito do Programa Brasileiro de Eliminação dos HCFCs – PBH, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente do Brasil, de acordo com as diretrizes do Protocolo de Montreal.
A GIZ é uma das três agências internacionais parceiras do PBH com projetos no setor de serviços de refrigeração. As outras duas agências são o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO).
Para nós, o Brasil é um parceiro muito importante para nosso programa por vários motivos, entre os quais, por ser grande em território e, também, pela grandeza do setor RAC (refrigeração e ar condicionado), que é bem desenvolvido, com muitos profissionais trabalhando na área. Oferecer perspectivas melhores de trabalho a esses profissionais, por meio da capacitação técnica, com melhoria de emprego e renda, é um dos nossos grandes objetivos com esse programa, como também a melhoria do clima e a proteção da Camada de Ozônio, com menor consumo de energia, e com níveis de emissões menores. Afinal, é por meio da eliminação e/ou redução do uso dos HCFCs e HFCs e também da introdução de novas alternativas tecnológicas com fluidos refrigerantes naturais que conseguiremos alcançar nossos objetivos de desenvolvimento sustentável.
ATUALMENTE, NA ETAPA 2 DO PBH, A GIZ ESTÁ IMPLEMENTANDO A CONSTRUÇÃO DE DOIS LABORATÓRIOS, NO FORMATO MINI SUPERMERCADOS, PARA TREINAMENTO E CAPACITAÇÃO DE MECÂNICOS E TÉCNICOS DE REFRIGERAÇÃO PARA USO SEGURO DE CO2 E HC-290. QUAL A IMPORTÂNCIA DESSA INICIATIVA E DE OUTRAS, COMO ESSA, VOLTADAS À MAIOR UTILIZAÇÃO DOS FLUIDOS REFRIGERANTES NATURAIS NO BRASIL?
Esta iniciativa para nós é bastante importante, ainda mais porque conseguimos um parceiro local (a Eletrofrio, vencedora da licitação internacional), uma indústria brasileira, que tem experiência com tecnologia de fluidos naturais. Existem grandes indústrias internacionais no mundo com essa tecnologia e projetos similares desenvolvidos em outros países, mas poder atuar nesse projeto com uma indústria parceira brasileira, juntamente com nossos consultores internacionais, é muito bom, pelo seu grande conhecimento do mercado.
Em projetos como esse existe muita troca de conhecimento, com o aprendizado que temos com nossos parceiros locais. Isso é muito bom. A gente sempre fala que o padrão do nosso trabalho é baseado no conhecimento do padrão internacional, mas é sempre muito importante adaptar tudo ao contexto nacional, ou seja, tecnologia, forma de treinamento etc.
A ETAPA II DO PBH ESTÁ PRESTES A SER CONCLUÍDA. VOCÊ PODERIA FALAR UM POUCO SOBRE OS OBJETIVOS E EXPECTATIVAS PARA A ETAPA III?
A GIZ vai continuar a trabalhar com o MMA e as outras agências internacionais, o PNUD e a UNIDO, nesta nova etapa do PBH. O objetivo da Etapa III será a eliminação dos HCFCs em 97,5% até 1º de janeiro de 2030.
É um grande desafio, mas o Brasil é compliant [cumpridor das suas metas]. Não tenho dúvidas de que vamos conseguir. O foco dessa etapa será predominantemente no setor de serviços. Antes também existiam trabalhos do programa, com outras agências, no setor de manufatura, mas eles serão encerrados ao concluirmos a implementação da Etapa II do PBH.
Atualmente, estamos fazendo um estudo setorial para a preparação dessa etapa, visando a abarcar, principalmente, as novas alternativas de fluidos refrigerantes disponíveis no mundo, especialmente, os fluidos naturais, que impõem um enorme desafio para a capacitação dos técnicos.
As outras agências também estão realizando estudos. A previsão inicial é que toda a estratégia da Etapa III esteja concluída no segundo semestre de 2023, para, depois, ser submetida à aprovação da Secretaria do Fundo Multilateral para a Implementação do Protocolo de Montreal. Mas, até lá ainda teremos bastante trabalho referente à Etapa II para cumprir, como a realização de treinamento e capacitação de técnicos de refrigeração para o uso seguro de fluidos refrigerantes naturais.
A GIZ POSSUI ESTRATÉGIAS PARA PROMOÇÃO DE EQUIDADE E OPORTUNIDADE, INDEPENDENTEMENTE DE QUESTÕES DE GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL, IDADE, ENTRE OUTROS. QUAL A IMPORTÂNCIA DESSA ESTRATÉGIA, ESPECIALMENTE VISANDO AMPLIAR O NÚMERO DE MULHERES NO SETOR DE REFRIGERAÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO?
A política da GIZ pela equidade e igualdade de gênero é muito importante. Procuramos promovê-la dentro da nossa organização, mas também em nossas ações com os países-parceiros, com governos e instituições, criando oportunidades e combatendo desvantagens e discriminações específicas de gênero. Sabemos que o setor de refrigeração é classicamente masculino, mas percebemos mudanças. No Brasil, por exemplo, temos no nosso programa uma professora-treinadora, a Jossineide Oliveira e Silva, que participou inclusive do Cool Training, na Alemanha, sobre fluidos refrigerantes naturais, que reuniu técnicas e técnicos de diversos países. Ela é uma pioneira do setor no Brasil, como instrutora.
Também tivemos este ano outro Cool Training, na Alemanha, com profissionais da Engenharia da América Latina, pela primeira vez, com mais de 50% de participação de mulheres. Então, estamos percebendo o crescimento da participação das mulheres no setor. Mas sabemos que ainda há muitos desafios para aumentar essa participação. (Veja exemplo de Cool Training na Alemanha em: https://www.green-cooling-initiative.org/news-media/news/news-detail/2022/08/18/spanish-cool-training-2022-photo-gallery).
Atualmente, nos nossos cursos de Boas Práticas em Refrigeração, a participação de técnicas é de 5%, com cada vez mais técnicas participando dos treinamentos junto com os homens. Procuramos fazer o monitoramento desses dados para documentar essa participação, o que já é importante, pois evidencia que as mulheres fazem parte do nosso objetivo.
O Protocolo de Montreal também tem uma política de igualdade de gênero. Neste momento, estamos elaborando uma estratégia de gênero para ampliar o número de mulheres em todos os nossos projetos, sempre alinhada com as políticas dos países-parceiros, como no caso do Brasil, o Ministério do Meio Ambiente. Estamos pensando, inclusive, em atividades específicas com turmas de mulheres.
POR FAVOR, FALE SOBRE SUA CARREIRA NA GIZ E POR QUE VOCÊ SE PREOCUPA PESSOALMENTE COM O MEIO AMBIENTE?
Eu comecei na GIZ-Proklima em 2013, como gerente de projeto. Antes disso, trabalhei em uma consultoria que atuava em projetos de consumo sustentável na União Europeia, com resíduos e produtos químicos. No Proklima, além do Brasil, trabalhei com projetos na Ásia e na Índia.
Sou geógrafa de formação, e estudei um ano no Brasil, no Rio de Janeiro, quando aprendi a lingua portuguesa. Meu objetivo na GIZ desde o início já era também trabalhar com os projetos da América Latina, pela minha especialização na área. Estou muito feliz em ter a oportunidade de trabalhar com o Brasil no nosso programa.
Para mim, é muito importante se preocupar em cuidar do meio ambiente hoje, pensando em criar um futuro melhor para as novas gerações. Quero uma vida melhor para todos no planeta, com a natureza preservada. Se nós conseguirmos proteger a natureza hoje, ela vai existir para sempre. Eu tenho um filho e penso muito nisso. É também uma preocupação pessoal.
DURANTE TODOS ESSES ANOS ATUANDO EM PROJETOS PARA A PROTEÇÃO DO OZÔNIO E DO CLIMA, VOCÊ CERTAMENTE FOI CAPAZ DE ACUMULAR UMA ENORME RIQUEZA DE EXPERIÊNCIA. QUAL FOI UMA DAS EXPERIÊNCIAS MAIS GRATIFICANTES DA SUA CARREIRA?
A melhor coisa do meu trabalho é poder trabalhar com as pessoas para cuidar do meio ambiente. Todas muito interessadas na proteção da Camada de Ozônio e do clima. O meu prazer é ter esses encontros pessoais em projetos do Proklima. No meu início na GIZ, por exemplo, eu participei de um Treinamento de Treinadores na Índia, que foi impressionante para mim, e eu o recordo até hoje. Sempre, quando as pessoas vêm para a Alemanha no nosso Cool Training, participam nos nossos treinamentos, workshops, e conferências internacionais, eu noto esse interesse comum de diferentes culturas pelo meio ambiente. (Veja exemplo de viagem-estudo na Alemanha: https://www.green-cooling-initiative.org/news-media/news/news-detail/2022/09/26/innovative-approaches-to-green-cooling-study-trip-to-germany).
A grande participação das pessoas, de todos os profissionais envolvidos com nossos projetos, demonstra que tudo que fazemos é muito mais do que só trabalho: é paixão, é dedicação, é alegria. É muito gratificante ver que os nossos projetos têm essa importância, pois impactam diretamente na vida das pessoas. Nós fazemos tudo isso juntos. Não vamos alcançar nada sozinhos.
A GIZ, EM UMA FRASE, POR FRANZISKA SCHMITTNER:
A GIZ é uma organização global que consegue muitos bons resultados para a preservação do meio ambiente. Nosso trabalho, realizado em cooperação com os países-parceiros, faz a diferença!
COOL TALKS – Por Susana Ferraz, jornalista, consultora de comunicação integrada da GIZ_PBH (Sete Estrelas Comunicação).